Elementos da conjuntura vista desde baixo – Março de 2015

Quero contribuir com um elemento para pensar a conjuntura atual que deveria ser central para nós, desde baixo e à esquerda, mas tem sido pouco considerado em detrimento de análises ora no campo institucional, ora de impressões avulsas das redes sociais: a força das ruas.

Desde o período das eleições (out de 2014), as maiores mobilizações de rua de expressão nacional foram as seguintes:

– Mobilizações dos professores e servidores públicos no Paraná contra cortes de direitos do governo Beto Richa (PSDB), que levaram 10 mil e depois 50 mil às ruas, a partir de um amplo leque da esquerda nos sindicatos e na categoria, desde o governismo aos setores mais críticos.

– Lutas contra aumento das tarifas de ônibus, que em São Paulo chegaram a levar 30 mil às ruas, além de organizar pelo menos 5 atos com mais de 10 mil pessoas e dezenas de outros menores pela periferia. Em SP, a luta enfrentava uma prefeitura do PT e era convocada pelo Movimento Passe Livre, uma força declaradamente anticapitalista e independente que articulou distintas forças à esquerda do governo.

– Atos do MTST, outra força à esquerda do governo e combativa (embora componha e defenda a Frente de Esquerda junto aos setores governistas) que mobilizaram mais de 10 mil pessoas na luta por moradia e também por outras pautas, como a questão do transporte público e, semana passada, da falta d’água.

– Atos de greves dos metalúrgicos no ABC Paulista que também colocaram 10 mil nas ruas pra lutar contra as milhares de demissões no setor no último período. Uma ativa solidariedade foi mobilizada entre trabalhadores de diferentes fábricas e o movimento conquistou vitórias, outra mobilização puxada pela classe organizada nos sindicatos com distintos setores da esquerda.

Apenas então podemos falar sobre os atos contra a Dilma, posteriores às eleições, que chegaram a colocar talvez 10 mil nas ruas. Ainda assim, esses atos tinham propostas políticas muito mais difusas e uma organização prévia bastante inferior, com menor capacidade de articular novas ações e propôr alternativas.

É claro que não só de marchas e atos se faz a pressão e a luta política; a greve (ou locaute) dos caminhoneiros é exemplo disso. No entanto, apesar da expressividade de suas ações – cuja divulgação contou com a boa vontade de uma direita golpista para seus propósitos – foram também bastante difusas, com reivindicações e motivações distintas em cada local. Parece inegável que, em algum grau, foram inclusive organizadas pelo empresariado do setor. A falta de uma organização e pauta conjunta, assim como entidades representativas de toda a categoria, elucida parte da dificuldade do governo em negociar com os bloqueios, assim como aponta para uma limitação da mobilização em suas reivindicações concretas – já que para a base, não se trata apenas de desgastar o governo.

O importante é que as ruas ainda são um espaço privilegiado de ação e demonstração de força. Inclusive, muito mais do que apenas levar gente às ruas (como aconteceu em Junho de 2013 e como provavelmente acontecerá no 15 de Março), o que conta é a organização, setores mobilizados e capazes de compartilhar análise, estratégia e projeto.

Apesar de tudo, nós temos força. Não é hora de nos paralizar nem temer, especialmente usando o Facebook como único parâmetro do ânimo popular e da articulação da direita. Enquanto ali manda o marketing político e o discurso oportunista, ir para a vida real exige muito mais, requer convicção e dedicação.

O governismo propaga um discurso alarmista sobre o impeachment buscando domesticar a luta social a seu favor, sustentando a mesma dicotomia de que precisa para se legitimar com o povo. É sim hora de ir às ruas e se organizar para construir uma alternativa política, que não seja o golpismo reacionário e nem o apoio a um governo de ex-querda, que hoje ataca frontalmente os direitos da classe trabalhadora e se alia aos setores conservadores e retrógrados em troca de governabilidade (que aos poucos lhe escapa aos dedos). Quem tá atento às ruas sabe que temos bons exemplos.